Sicómoro - III



 

Liberdades…

 

Estamos a poucos dias do Dia da Liberdade. Por feliz coincidência a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, no dia 15 de abril, publicou em Diário da República a nova constituição da Comissão da Liberdade Religiosa (CLR), reconduzindo Vera Jardim na presidência. No mesmo dia, a Conferência Episcopal Portuguesa, no comunicado de encerramento da sua 200.ª Assembleia Plenária anunciava os representantes da Igreja Católica na referida comissão: Alfredo Teixeira e Pedro Vaz Patto.
A CLR terá ainda como membros Esther Mucznik (Comunidade Israelita de Lisboa), Fernando Manuel Soares Loja (Aliança Evangélica Portuguesa), e Mahomed Iqbal (Comunidade Islâmica de Lisboa). Os restantes membros serão representantes de outras comunidades ou especialistas em Ciências Políticas e Jurídicas: Huzur Mukhi Rahim Firozali, Alpesh Kumar Ranchordas,  Luciano José dos Santos Cruz, Miguel Chaves Ribeiro Assis Raimundo e Eduardo André Folque da Costa Ferreira.

 
A visão católica sobre o assunto está registada na Declaração Dignitatis Humanae, sobre a Liberdade Religiosa, do Concílio Vaticano II, e afirma no n.º 2 «que a pessoa humana tem direito à liberdade religiosa. Esta liberdade consiste no seguinte: todos os homens devem estar livres de coação, quer por parte dos indivíduos, quer dos grupos sociais ou qualquer autoridade humana; e de tal modo que, em matéria religiosa, ninguém seja forçado a agir contra a própria consciência, nem impedido de proceder segundo a mesma, em privado e em público, só ou associado com outros, dentro dos devidos limites».


A própria Lei da Liberdade Religiosa (2003), no capítulo II, artigo 8.ª sobre Direitos individuais de liberdade religiosa compreende o direito de: «a) Ter, não ter e deixar de ter religião; b) Escolher livremente, mudar ou abandonar a própria crença religiosa; c) Praticar ou não praticar os atos do culto, particular ou público, próprios da religião professada; d) Professar a própria crença religiosa, procurar para ela novos crentes, exprimir e divulgar livremente, pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, o seu pensamento em matéria religiosa; e) Informar e se informar sobre religião, aprender e ensinar religião; f) Reunir-se, manifestar-se e associar-se com outros de acordo com as próprias convicções em matéria religiosa, sem outros limites além dos previstos nos artigos 45.o e 46.o da Constituição; g) Agir ou não agir em conformidade com as normas da religião professada, no respeito pelos direitos humanos e pela lei; h) Escolher para os filhos os nomes próprios da onomástica religiosa da religião professada; i) Produzir obras científicas, literárias e artísticas em matéria de religião.»
 
Trouxe este assunto ao Sicómoro para vermos a importância da liberdade religiosa e do respeito pela consciência pessoal e coletiva. Aqui e ali começam a ver-se tiques e toques de autoritarismo e de desrespeito pela liberdade religiosa: restrição do acesso a assistência religiosa nos hospitais nos inícios da pandemia; ostracização da disciplina de Educação Moral e Religiosa Católica na elaboração dos horários escolares para as pontas dos turnos (início ou finais dos dias), alegando que aqueles que não estão inscritos não podem ser prejudicados, mas prejudicando ou desmotivando a inscrição àqueles que pretendem frequentar a disciplina; a desvalorização das tradições religiosas do povo português, substituindo-as por celebrações alternativas (Todos os Santos e Fiéis por Bruxas; Natal por festa de inverno e Páscoa por festa da primavera); o quase banimento da esfera pública do comentário e noticiário sobre assuntos religiosos (excetuando escândalos) e dos comentadores com filiação religiosa; o alarido porque houve missa na escola ou compasso no lar; o ataque a cruzeiros e nichos com imagens religiosas, a proibição dos presépios nos edifícios públicos, etc...


Portugal é em regra um país tolerante, e a cidade do Porto um exemplo disso mesmo. Ainda no passado sábado, como fiquei feliz ao ver um jovem casal, judeus religiosos, pois o homem levava o kippá (pequeno chapéu) e a mulher um véu, a passear na avenida da Boavista, de mão dada, livremente, sem constrangimentos, no seu dia sagrado. No Porto, respira-se tolerância e liberdade. Todos podemos viver em paz e concórdia, não impondo as nossas ideias e pontos de vista, mas dando a cada um a liberdade de viver e de se poder exprimir religiosamente, sem constrangimentos e sem julgamentos.
Fazemos votos de bom trabalho à nova CLR e que tenha uma postura mais interventiva face àqueles que querem impor as suas agendas na esfera pública.

 

Sérgio Carvalho

https://sergiocarvalho-escritos.blogspot.com

 

 

 

 

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